domingo, 8 de julho de 2012

A Degradação Ambiental da Micro-bacia do Rio Beberibe na Feira Livre de Beberibe, Recife/Olinda – Pernambuco.


Patrícia Alves, Márcia Gomes e Rodrigo Leal


Resumo: O presente trabalho objetiva analisar a perspectiva ambiental dos vendedores ambulantes, pedestres e a população residente na área da Feira Livre de Beberibe em relação à degradação ambiental do Rio Beberibe, Recife/Olinda – Pernambuco. Estabelecendo como objetivos específicos: conhecer e compreender os impactos ambientais negativos gerados pelos resíduos sólidos e líquidos provenientes da feira livre de Beberibe; identificar, comparar e analisar as causas da degradação ambiental no Rio Beberibe, baseando-se na própria perspectiva dos feirantes, pedestres e população residente; e por fim, identificar as alternativas idealizadas pelo público-alvo no que concerne a busca pela sustentabilidade e organização do espaço local, além da tentativa de levar tais alternativas ao conhecimento dos poderes públicos municipais. A pesquisa possui orientação qualitativa estando centrada na análise de conteúdo, aliando referências teóricas a observações e interpretações direta dos fatos. Faz-se uso da revisão bibliográfica, documental e cartográfica, levantamento, coleta, tratamento e análise interpretativa de dados secundários e primários, observação in loco, entrevistas semi-estruturadas direcionada aos comerciantes ambulantes, pedestres e população residente na área de estudo, além da análise interpretativa do material obtido. Os resultados obtidos indicaram a presença de conflito territorial entre pedestres, feirantes, moradores e até pelo Rio Beberibe. É intenso o estado de degradação ambiental da área. Os feirantes, em sua maioria jogam os resíduos da feira no Rio, enquanto todo esgoto das residências dos moradores da área é direcionado ao Rio. Para os entrevistados, o Rio não possui importância alguma em suas vidas. Por se tratar de uma área de divisa municipal, a gestão ambiental, segundo os entrevistados, da região é deficiente, fato que complica mais o atual quadro de degradação do Rio Beberibe.


Palavras-chave: Percepção Ambiental, Degradação Ambiental, Rio Beberibe e Sustentabilidade socioambiental.


1 Introdução

Ao longo da história da humanidade, os rios têm uma importância significativa na expansão e formação territorial, pois “têm sido utilizados como vias de penetração para o interior e facilitado o crescimento de aglomerados urbanos e áreas cultivadas” (CUNHA, 2003, p. 224), levando-se também em consideração seu indispensável uso para a sobrevivência humana.
A constante relação desequilibrada, desenfreada e impensada, sem levar em consideração a capacidade de suporte do ambiente, este aqui entendido como resultado de inter-relação e interdependência de vários elementos que compõem o meio, no espaço e no tempo (COUTINHO, 2009), tem gerado desequilíbrios consideráveis nas dinâmicas dos sistemas das águas, do seu ciclo hidrológico. Neste sentido, o presente trabalho versa analisar a perspectiva ambiental dos vendedores ambulantes, pedestres e a população residente na área da Feira Livre de Beberibe em relação à degradação ambiental do Rio Beberibe, Recife/Olinda – Pernambuco. Estabelecendo como objetivos específicos: conhecer e compreender os impactos ambientais negativos gerados pelos resíduos sólidos e líquidos provenientes da feira livre de Beberibe; identificar, comparar e analisar as causas da degradação ambiental do Rio Beberibe, baseando-se na própria perspectiva dos feirantes, pedestres e população residente; e por fim, identificar as alternativas idealizadas pelo público-alvo no que concerne a busca pela sustentabilidade e organização do espaço local, além da tentativa de levar tais alternativas ao conhecimento dos poderes públicos municipais.
A pesquisa possui orientação qualitativa estando centrada na análise de conteúdo, aliando referências teóricas a observações e interpretações direta dos fatos. Faz-se uso da revisão bibliográfica, documental e cartográfica, levantamento, coleta, tratamento e análise interpretativa de dados secundários e primários, observação in loco, entrevistas semi-estruturadas aos comerciantes ambulantes, pedestres e população residente na área de estudo, além da análise interpretativa do material obtido.
O estudo em pauta justifica-se por julgar-se necessário oferecer subsídios ao conhecimento de como é a relação dos que atuam na Feira Livre de Beberibe com o seu meio, a perspectiva ambiental destes e dos pedestres e população residente em relação à organização territorial da área. Neste sentido, se buscará conhecer e compreender os impactos negativos que são gerados pelas atividades desenvolvidas na área, além de buscar alternativas de (re)ordenamento ambiental, proporcionando assim, uma melhoria da sanidade ambiental, reordenamento do território e mudança na paisagem.


2 Os Rios: interações e intervenções humanas, breves considerações


Dentre os diversos tipos de impactos negativos aos ambientes de rios, aqui se destaca às causadas pelo crescimento de áreas urbanas sem as condições necessárias às manutenções de áreas verdes, necessárias ao equilíbrio do sistema hidrológico, e “sem as mínimas condições de saneamento (lixo, sedimentos e esgoto)” (CUNHA, 2003, p. 224).
Segundo Sandra Cunha (2003, p. 224),
Os rios espelham, de maneira indireta, as condições naturais e as atividades humanas desenvolvidas na bacia hidrográfica, sofrendo em função da escala e intensidade de mudanças nesses dois elementos, alterações, efeitos e/ou impactos no comportamento da descarga, carga sólida e dissolvida, e poluição das águas.

É necessário ressaltar que, em tais áreas, a crescente diminuição da calha dos rios e canais é consequência da erosão das margens e assoreamento provocados pela chegada de sedimentos, inclusive dos resíduos sólidos formando “bancos e ilhas” de lixo, reduzindo assim, a capacidade de escoamento do canal e favorecendo a inundações e a qualidade da água, além da qualidade de vida dos indivíduos direta ou indiretamente afetados por tais problemas.
Este quadro de degradação mencionado pode ser evidenciada, especificamente, em um Rio de Pernambuco, Brasil – O Rio Beberibe. Esta situação tem sido agravada, sobretudo, pela urbanização desordenada, tendo como uma das consequências a falta de saneamento ambiental, levando-se em consideração que o rio em pauta passa por áreas extremamente pobres.





3 O Rio Beberibe: seus caminhos e descaminhos




O Rio Beberibe, cuja nascente localiza-se no Município de Camaragibe, Pernambuco, pela junção dos Rios Pacas e Araçá, possui 23,7Km de extensão, situa-se nos municípios de Camaragibe, Recife e Olinda.
Possui como principais afluentes o Canal da Malária, o Córrego Euclides da Cunha e o Canal Vasco da Gama, unindo-se ao Rio Capibaribe e desaguando-se no Oceano Atlântico.
Recentemente, alguns projetos têm sido desenvolvidos pelos poderes públicos em pró da revitalização do Rio Beberibe, dentre eles destacam-se a obra de dragagem do rio, que iniciou-se em maio de 2012, dentre o material retirado do rio “uma parte vai para aterros sanitários e outra vai para um 'bota fora' a seis milhas náuticas daqui, em duas embarcações, obedecendo aos estudos ambientais”, é o que afirma o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (COUTINHO, 2012).
Tal projeto tem o sentido de atender às áreas mais atingidas do rio, aumentando o seu canal permitindo a navegação, com área de ciclovia para humanizar a sua margem e transferência de populações ribeirinhas, com o intuito de permitir a preservação de matas ciliares. “Vamos preservar também os locais de mata ciliar, mas precisamos contar com a ajuda da população, para que não se jogue mais material sólido [lixo] no rio, para ajudar a preservá-lo”, detalha o secretário de Recursos Hídricos e Elétricos, Almir Cirilo (COUTINHO, 2012), neste sentido se tem a importância da Educação Ambiental no planejamento, gestão e monitoramento dos programas voltados à sustentabilidade dos ambientes (COUTINHO, 2009).
Em março deste ano, 2012, também ocorreu a primeira oficina de diagnóstico para a elaboração do plano de manejo da Área de Preservação Ambiental Aldeia-Beberibe (APA Aldeia-Beberibe). A Unidade de Conservação (UC), com área total de 31.634 hectares, tem como objetivos promover o desenvolvimento sustentável; proteger espécies ameaçadas de extinção e mananciais hídricos; incentivar ações de restauração florestal e melhorar a qualidade de vida da população local (PERNAMBUCO, 2012) o que contribui à gestão ambiental do Rio Beberibe. Fica-se, então, a grande vontade e a torcida de que tais planos e projetos realmente atendam aos seus objetivos.

 

4 O Rio Beberibe e a Feira Livre: limites e complementaridades


Um ponto espacial de intensa degradação ambiental do Rio Beberibe, constatado ao logo de seu leito, desde a nascente até sua confluência ao Rio Capibaribe, se dá na Feira Livre de Beberibe, localizado especificamente na ponte de divisa dos Municípios de Recife e Olinda (Figura 1). 

Nesta área, o rio sofre com os diversos tipos de degradação, aqui destaca-se os lançamentos de resíduos sólidos e líquidos, “sobras de feira”, pelos vendedores ambulantes que atuam na Feira Livre de Beberibe (Figura 2) e o lançamento do esgoto doméstico das residências circunvizinhas.
Tal feira é caracterizada por atrapalhar o tráfego de pedestres e veículos e sua organização é dificultada por ser área de atuação político/administrativa diferentes, por estar entre Recife e Olinda (Figura 3 e 4).

Neste quadro, a análise da causa dos lançamentos destes resíduos nas águas do Rio Beberibe pode contribuir à gestão ambiental desta área, tentando levar ao conhecimento político/administrativos municipais, alternativas de sustentabilidade do Rio Beberibe, ordenamento territorial e melhoria na paisagem, o que colabora para a sanidade ambiental e a qualidade de vida dos indivíduos que ali atuam.





5 A Luta pelo Território: feirantes X moradores locais X pedestres X Rio Beberibe


No presente estudo foram aplicados nove questionários semi-estruturados aos feirantes, moradores locais e pedestres, constituindo uma amostra de três questionários para cada categoria, com idades variando de 24 a 64 anos, sendo que cinco indivíduos do sexo masculino e quatro do sexo feminino.


Foi constatado que a população residente, em sua maioria, residia em regiões do interior de Pernambuco, o que evidencia em um segundo plano de que houve êxodo rural para uma área que não estava capacitada a suportar estas pessoas, levando-as a ocupar áreas de várzeas e planícies fluviais: um território de imprescindível importância à dinâmica do sistema hidrográfico. Tais áreas, por sua vez, estando ocupadas geram um ciclo de problemas ambientais com consequências significativas aos aspectos socioeconômicos.
Os entrevistados, ao indicarem os problemas ambientais da área em evidencia se contradisseram em alguns aspectos, a População Residente e os Pedestres, em sua maioria, atribuíram como problema ambiental o lixo proveniente da feira. Já os feirantes atribuíram aos carros. O fato é que, desde já, há uma ausência de conceito referente aos assuntos ambientais por parte de muitos dos entrevistados.

Quanto à opinião sobre a paisagem da área, mais uma vez a População Local e os Pedestres demonstraram uma percepção semelhante ao afirmarem que a paisagem da área é caracterizada pela “bagunça” e esta “bagunça” demonstra a necessidade de ordenamento deste território, onde os feirantes ocupam as calçadas, lugar de movimentação dos pedestres, estes que são obrigados a andar pela área de rolamento dos veículos e assim vai gerando um ciclo de caos e desordem do urbano. Os feirantes atribuem, novamente, a culpa aos “carros”, chegando a enfatizar que a paisagem é “ótima”.


   A falta de percepção ambiental foi comprovada quando os entrevistados chegaram a dizer que o Rio Beberibe não tinha nenhuma importância na vida deles, ou ao menos uma: “Pra desaguar o esgoto mesmo”, segundo a moradora L2. De fato, foi constado in loco que as casas utilizam o Rio como meio de escoamento dos resíduos sólidos e líquidos. 
Ao indicarem alternativas de como promover a qualidade das águas do Rio Beberibe, bem como sua revitalização, os entrevistados afirmaram que “Vai demorar né?! Mas se começar pelo menos a não jogar mais lixo lá já é um começo, sei que tem um caminho longo e outras comunidades jogam também”. (L1); “Tirar a feira, conscientizar a população e fazer um esgotamento sanitário eficiente”. (L2); Se ver a importância dada pelos entrevistados quanto a conscieticação dos indivíduos que ali atuam, o Pedestre (P2) ressalta este fato em sua afirmação: “Primeiro conscientização, pois só as pessoas podem melhorar a situação do rio”.
            O Pedestre (P1) demonstrou a consciência de que é necessário ““Parar de jogar lixo e retirar um pouco essas casas que ficam muito perto dele” (P1), por outro lado, os feirantes, com receio, talvez, de que percam seu espaço de trabalho mencionaram que a alternativa era: “Parar de despejar esgoto e deixar os feirantes onde está”. (F1); “Deixar de despejar esgoto e diminuir a passagem desses carros por aqui” (F2).
Com a análise dos dados e estudo de campo, constatou-se que há conflitos de interesse no território quanto aos:
Pedestres – estes que apontam como fatores de dificuldades da área o grande fluxo de carro e a feira livre que ocupam as calçadas, para eles o Rio Beberibe não tem importância, mas estão insatisfeitos com a atual situação de degradação, destacando a importância da conscientização das pessoas quanto às questões ambientais;
Moradores – onde se verificou que nenhum dos entrevistados possuem fossas e todo lixo e esgoto é direcionado ao Rio Beberibe, e as opiniões variaram no requisito Bom/regular/ruim em morar perto da feira. O L1 se contradisse ao afirmar ser bom morar perto da feira, e o desejo de retirá-la para a resolução dos problemas da localidade. Apontam como fatores de dificuldade o grande fluxo de carro e a feira livre que ocupam as calçadas. A importância do Rio Beberibe para eles se resume em este ser uma via de escoamento do esgoto e atribuem como agentes de degradação do Rio, os feirantes.

Feirantes – os feirantes F2 (frutas) e F3 (temperos) revelaram que jogam todo o resto da feira no Rio Beberibe, apenas o F1 (frutas e verduras) evidenciou que vende o lixo. Eles atribuem a culpa da desorganização do espaço ao intenso fluxo de carros, mas acham a paisagem “boa”. O Rio Beberibe não tem importância nenhuma para eles. Culparam os moradores pela degradação do Rio, devido ao lançamento de esgoto e não querem sair da área, mas desejam a diminuição do fluxo de carros no local.



6 Considerações Finais
O principal problema identificado com relação aos pedestres é relacionado à ocupação de sua área de mobilidade urbana pela Feira Livre do Beberibe; já para os feirantes o problema se dá pelos carros, mesmo sabendo que ali é direcionado para transito de veículos, e dizem que se não fosse o tráfego de carros estaria tudo muito bem. Já para os moradores o problema é o mesmo observado pelos passantes: o da invasão do espaço destinado para pedestres pelos feirantes, entretanto, estes acham bom estarem próximo da feira livre.
Ao que se refere ao Rio Beberibe foi verificado que o mesmo, para as pessoas daquela área, tanto feirantes moradores e pedestres, é como se não existisse, até mesmo pela falta de visibilidade do mesmo devido às bancas que tomam tanto o espaço que até fazem as pessoas esquecerem que ali tem um rio.
Durante a pesquisa de campo, verificou-se que nas margens do Rio existe criação de porcos e cavalos. Além disso, o esgoto das residências é lançado diretamente no rio e a maioria dos dejetos, tanto sólido como orgânicos, são também são jogados livremente pelos comerciantes da área, que atuam, especificamente, na feira sem nenhuma preocupação e consciência ambiental.
Por se tratar de uma área de divisa de municípios – Recife e Olinda –, sua administração torna-se complicada, pois uma prefeitura fica “jogado” a responsabilidade na outra. Segundo os feirantes, a prefeitura de Olinda havia feito uma proposta pra lhes retirarem da área e colocar-lhes num lugar bem próximo. Muitos aprovaram a proposta, pois é um local muito próximo de onde estão, mas que ainda falta ser desocupado. Entretanto, o projeto fica só no papel e quando (se) sair da ideologia, a monitoração e gestão deverão ser de qualidade, além de que os poderes públicos invistam em Educação Ambiental – um poderoso instrumento de gestão ambiental. É necessária a retomada da visibilidade e importância do Rio Beberibe. É necessária uma retomada aos valores históricos-culturais-ambientais.

Referências

COUTINHO, Katherine. Em PE, dragagem e revitalização do Rio Beberibe vão custar R$ 63 milhões. G1 Pernambuco. Pernambuco, 02/05/2012, Notícias. Disponível em: . Acesso em: 8 maio 2012.

COUTINHO, Solange Fernandes Soares. A educação ambiental na formação de professores. In: SEABRA, Giovanni. (Org.). Educação ambiental. João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2009.

CUNHA, Sandra Baptista. Canais fluviais e a questão ambiental. In: CUNHA, Sandra Baptista; GUERRA, Antonio José Teixeira. (Org.) A questão ambiental: diferentes abordagens. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.

PERNAMBUCO. Companhia Pernambucana de Recursos Hídricos. CPRH realiza primeira oficina da APA Aldeia-Beberibe. Disponível em: . Acesso em: 9 maio 2012.

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