segunda-feira, 9 de julho de 2012

Acessibilidade: Avaliação da estrutura física do campus UFPE - Recife

Amanda Cavalcante, Ana Laura, Anne Catharine, Débora Priscila, Luan Amim, Marcílio Ricardo, Renata Souza

Introdução

Após a segunda guerra mundial, houve a criação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas - ONU, iniciando a ideia contemporânea de direitos individuais e igualdade social. Cada indivíduo, como sujeito de direitos, deveria ter dali em diante, os seus direitos humanos protegidos também na esfera internacional, admitindo-se a possibilidade de intervenções supranacionais, em um país, nesta matéria (TRINDADE, 1998). Entretanto como falar em igualdade de direitos em uma sociedade com sistema econômico capitalista, com modo de produção que é estruturalmente excludente. Esta exclusão social não é algo recente, é na verdade inerente ao processo de acumulação, contrariamente aos direitos de cidadania previstos na declaração de diretos humanos.
Esta desigualdade social atinge diversos grupos em desvantagens, inclusive pessoas deficientes. Deficiências que eram vistas como castigo na idade media, e posteriormente passaram a ter um caráter médico, onde o individuo apresentava um padrão distinto do considerado normal. Embora a diferença seja no corpo, tal como a diferença racial ou sexual estas pessoas tem uma maior dificuldade de enfrentar a desigualdade, a razão disso pode estar na complexidade em desnaturalizar a desigualdade atribuída às pessoas com deficiência e apreender os componentes culturais nela envolvidos, já que essa desigualdade está fundada em uma ideia de privação e incapacidade que as aprisiona em uma narrativa de tragédia pessoal (MARTINS, 2005).
Felizmente a partir da declaração universal dos direitos humanos, foram criados alguns mecanismos de proteção aos direitos do cidadão e em 1993 foi instituído no Brasil, a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, trazendo entre suas diretrizes a determinação de incluir a pessoa com deficiência em todas as iniciativas governamentais relacionadas à educação, saúde, trabalho, edificação pública, seguridade social, transporte, habitação, cultura, esporte e lazer (BRASIL, 1993, art. 5º, inc. III). Somente em 1999, surgiu a legislação específica para garantir às pessoas com deficiência física e sensorial condições básicas de acesso e permanência na educação, com a criação da Portaria n.º1.679, que incluiu requisitos de acessibilidade nos instrumentos de avaliação dos cursos de nível superior, listados no respectivo documento. Até então, poucos deles conseguiam estudar, e eram raros os que conseguiam chegar ao nível superior devido à falta de adaptações e estrutura de apoio nas instituições de ensino.
Atualmente, as instituições cumprem a legislação disponibilizando vagas para pessoas com deficiência, entretanto, na maioria dos casos, a instituição não oferece a estrutura necessária para adaptação dos mesmos e muitas vezes até oferecem, mas de forma precária. As estruturas para adaptação do deficiente são aplicadas em desacordo com as normas estabelecidas, que determinam adaptações necessárias para sanitários, pavimentos, vagas reservadas nos estacionamentos, portas com aberturas maiores que 85 cm, puxadores de portas adaptados, rampas de acesso nos calçamentos dentre outras exigências das normas ABNT NBR 9050, e em muitos casos ocorre o descaso com a manutenção destas adaptações estruturais. Infelizmente a sociedade ainda não assimilou completamente a ideia de que é responsável pelas dificuldades que as pessoas com deficiência vivenciam, pois não prevê ajustes em sua organização para conviver com as diferenças que essas pessoas apresentam.
Este trabalho objetiva analisar as condições de acessibilidade de parte das estruturas físicas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), tais como: centros, restaurante universitário, bibliotecas, banheiros e pavimentos. Esta análise será realizada sob o olhar dos deficientes físicos que utilizam essas estruturas, e com base nas recomendações contidas nas normas brasileiras de acessibilidade.

Justificativa

É extremamente importante reconhecer as diferenças nas dificuldades de cada um sem deixar de promover a igualdade de acesso para todos, e a universidade deveria disponibilizar em suas organizações estruturas adequadas e adaptadas. Mas para que haja estas adaptações para inclusão social, primeiramente é necessária a mudança de valores do homem.
Este projeto é de extrema importância, para o conhecimento a cerca da acessibilidade na Universidade Federal de Pernambuco, identificando os principais problemas existentes, com o propósito de buscar amenizar as dificuldades enfrentadas não só pelos portadores de necessidades especiais, como também da comunidade acadêmica de maneira geral. E com isso auxiliar a UFPE a repensar seu orçamento, incentivando-a a investir um pouco mais, em estruturas mais adequadas, que atendam as necessidades de todos.

Materiais e Métodos

Este trabalho foi realizado nas dependências da Universidade Federal de Pernambuco, Campus Recife, localizada na Av. Professor Morais Rego, 1235 – Várzea, Recife-PE.
Foram escolhidos três centros acadêmicos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), para aplicação dos formulários: Centro de Educação (C.E), Centro de Artes e Comunicação (CAC) e Centro de Ciências Biológicas (CCB). Coletamos algumas informações através de um ofício emitido pela PROACAD, contendo a relação de portadores de necessidades especiais nos centros acadêmicos da UFPE, até novembro de 2011.
            Para aplicação dos formulários, foi primeiramente solicitado que os participantes assinassem um termo de participação, que continha os objetivos do trabalho, bem como informações sobre identificação e autorização de uso de mídias no ato das entrevistas. Este termo pode ser visualizado no anexo 1.
As entrevistas foram realizadas mediante formulário (anexo 2), onde foi possível selecionar as maiores dificuldades enfrentadas pelos entrevistados, direcionando-nos para as estruturais físicas: Escolaridade, portas de acesso para sala de aula, rampas de acesso, banheiros adaptados e pavimentos do Campus UFPE-Recife.
Após seleção das estruturas a serem analisadas, foram realizadas fotografias e medições dos locais indicados com utilização de trena (anexo 3). Para averiguação das estruturas da UFPE, utilizou-se norma ABNT NBR 9050: 2004.
  
Resultados

De acordo com os dados fornecidos pela PROACAD, a distribuição de alunos com deficiência nos centros pode ser visualizada no Quadro 2:

Centros
Alunos
Curso
C.A.C
1
Arquitetura e Urbanismo
C.A.C
1
Letras
C.A.C
1
Expressão Gráfica
C.A.C
1
Design
C.E.
3
Pedagogia
C.C.B
1
Biomedicina
Quadro 2 – Distribuição dos alunos na UFPE.

As entrevistas foram feitas com quatro pessoas, cujas identidades não poderão ser reveladas, adotando-se pseudônimos para identificação das mesmas. As respostas dos formulários foram um pouco superficiais, podendo ser melhor visualizadas na Tabela 1.

Questão
Pessoa A
Pessoa B
Pessoa C
Pessoa D
1
Dificuldade de locomoção
_
_

2
Não
Não. Mora em São Lourenço.
Não. Barro

3
Carro particular, as vezes ônibus
Kombi pnt
Ônibus

4
CCSA, CE, CFCH, Educação Física.
Dificuldades: Sinalização precária, ex: indicando lugares específicos.
Educação Física. PROMU.
Dificuldades: Tem rampas, mas falta manutenção; há desnível nas estruturas (batentes); Não há calçadas adequadas (precisa andar pela rua).
CFCH e Educação Física.
Dificuldades: Estrutura ruim para normais e deficientes; o som da academia funciona quando quer; piscina precária; Lama no caminho; pista de atletismo incompleta.

5
Sim.
Opinião: Tem apenas uma entrada para cadeirante e não tem piso tátil.
Não
Sim.
Tem entrada para deficientes.

6
Dificultado.
Principais: Pontos de alagamento em frente ao CAp, calçamento precário.
Dificultado
Dificultado.
Principais: Lama no caminho.

7
Sim. Bolsa permanência.
_
Sim. Bolsa atleta

8
Sim.
Dificuldades: Sala de informática precária, acesso a biblioteca dificultado pela entrada, porta não corrediça.
_
Sim. Academia abandonada

9
Sim. ABNT
Não
Sim. Todos os lugares precisam estar adaptados, é uma lei Federal.

10
Iniciar projetos que visem a melhoria da estrutura física da mesma.
Manutenção constante, mais acesso à rampas; manutenção de calçadas.
Rampa para deficientes; Deveria haver desconto no R.U; Funcionário apto para oferecer ajuda e/ou segurar prato e/ou bengala.

11
Sim
Não. Apenas na Católica
Sim. Várias.

12
Sim
Sim
Sim.

13
Cadeirante
Mãe de cadeirante
Baixa visão, só enxerga muito de perto e se as letras forem enormes.

Tabela 1. Disposição das questões do formulário com as respostas dos entrevistados, identificados como pessoa A,B,C e D.

Seguem abaixo dados das medições efetuadas no Centro de Ciências Biológicas referente à estrutura física da escolaridade (Quadro 3) e biblioteca (Quadro 4) respectivamente:
largura (cm)
comprimento (cm)
Altura (cm)
Escolaridade
Porta de entrada
35,5
53,5
X
Balcão
X
X
38
Quadro 3 – medições na escolaridade.

largura (cm)
comprimento (cm)
Altura (cm)
Biblioteca
Porta principal
82
X
X
Detector
83
X
X
Balcão de atendimento
X
X
29
Mesa para consulta
X
X
29,5
Mesa coletiva
X
X
29
Bancada individual
39,4
38
29,5
Quadro 4 – medições na biblioteca.

No estacionamento do C.C.B. não foi observado nenhum tipo de sinalização vertical, somente sinalização horizontal, porém muito danificada conforme dados das medições efetuadas no estacionamento (Quadro 5).
Estacionamento
largura (cm)
comprimento (cm)
altura (cm)
Rampa
62
X
X
Rampa de acesso ao centro
34,5
X
X
Orelhão
X
X
57
Quadro 5 – medições no estacionamento.

Abaixo estão as medições efetuados nos banheiros feminino (Quadro 6) e masculino (Quadro 7), entretanto não foram identificados sinalizações nas portas indicando símbolo internacional de acesso a portadores de cadeiras de rodas (P.C.R.).
Banheiro Feminino
largura (cm)
comprimento (cm)
altura (cm)
Porta de entrada principal
35,5
X
X
Porta específica
39,5
X
X
Chão / pia
X
X
35,5
Cabine específica
54,5
70
X
Quadro 5 – medições no banheiro feminino.

Banheiro Masculino
largura (cm)
comprimento (cm)
altura (cm)
porta de entrada principal
34,8
X
X
porta específica
38,7
X
X
Chão / pia
X
X
37,8
Cabine específica
54,5
67,5
X
Quadro 6 – medições no banheiro masculino.

No Centro de Artes e Comunicação foi encontrado um elevador que apesar de ser utilizado atualmente para transporte de pessoas, segundo relatos de um funcionário do turno da noite, por erros de entrega, foi instalado inicialmente para transporte de cargas. Seguem abaixo dados das medições efetuadas no C.A.C referente à estrutura física da escolaridade (Quadro 7) e biblioteca (Quadro 8) respectivamente:
largura (cm)
comprimento (cm)
Altura (cm)
Escolaridade
Porta de entrada
X
X
x
Balcão
X
X
87
Quadro 7 – medições na escolaridade.
Na biblioteca foi observado a existência de piso tátil e rampa de acesso até a porta detectora de livros. E por trás do balcão de empréstimo existe uma rampa que permite acesso a área das estantes.
Biblioteca
largura (cm)
comprimento (cm)
Altura (cm)
Porta Principal
230
X
X
Detector
90
X
x
Balcão de atendimento
X
X
130
Mesa para consulta
X
X
75
Mesa coletiva
X
X
75
Bancada individual
26
x
52
Quadro 8 – medições na biblioteca.

Nos banheiros não havia sinalização internacional de acesso e foram realizadas as seguintes medições para banheiro feminino (quadro 9) e masculino (quadro 10), respectivamente.
Banheiro Feminino
largura (cm)
comprimento (cm)
altura (cm)
porta de entrada principal
106
X
X
porta específica
108
X
x
Chão / pia
X
x
80
Cabine específica
150
220
x
Quadro 9 – medições no banheiro feminino.
Colunas1
largura (cm)
comprimento (cm)
altura (cm)
Banheiro Masculino
porta de entrada principal
93
X
X
porta específica
124
X
X
Barras de apoio
X
x
76
Chão / pia
X
x
85
Cabine específica
150
224
x
Quadro 10 – medições no banheiro masculino.
No estacionamento havia sinalização vertical internacional de acesso, e também sinalização horizontal. As análises feitas no estacionamento forneceram os seguintes dados (Quadro 11):
Estacionamento
largura (cm)
comprimento (cm)
altura (cm)
Rampa
X
X
184
Rampa de acesso ao centro
152
x
x
Orelhão
X
x
157
Quadro 11 – medições no estacionamento.

Discussão
As entrevistas foram feitas com quatro pessoas, cujas identidades não poderão ser reveladas, adotando-se pseudônimos para identificação das mesmas. Por isso não foi possível realizar filmagem, fotografias e gravações de áudios com os entrevistados como havia sido proposto no trabalho.  
Com os resultados obtidos a cerca das estruturas físicas sob o olhar dos entrevistados, fez-se notar o quanto a comunidade acadêmica deixa passar problemas que acabam afetando não somente deficientes como pessoas normais também, além de perceber o quão unidos são os deficientes, no que diz respeito a preocupação com o outro, ao citar estruturas, que muitas vezes nem utilizam, mas que o outro precisa.
A pessoa A é estudante de pedagogia, cadeirante e relatou a dificuldade que enfrenta ao deslocar-se pelos centros, mostrando que apesar da Universidade possuir estruturas de acessibilidade, estas nem sempre cumprem a Norma da ABNT.
A pessoa B é mãe de uma criança cadeirante, e relatou que não enfrenta muitas dificuldades no seu trajeto, mas que existem vários pontos que poderiam ser melhorados, para facilitar, de fato, a locomoção de pessoas deficientes nos centros.
A pessoa C é estudante de Marketing na Faculdade Universo, mas frequenta o Núcleo de Educação Física e Desportos da UFPE, de onde é atleta paraolímpico, recebendo bolsa Atleta pela Instituição Federal. Passou a ser deficiente por um acidente de moto, no qual perdeu quase totalmente sua visão, podendo enxergar apenas letras muito grandes, numa distancia mínima de seus olhos. Após o trauma de perder a visão, vivenciou o péssimo momento do abandono familiar, por questões religiosas. Já entrou em depressão, tentou suicidar-se durante uma madrugada, mas foi impedido e graças a uma assistente social, que lhe mostrou o caminho dos esportes, hoje é atleta, já ganhou medalha de ouro e vive um dia de cada vez, buscando tranquilidade e se adaptando as dificuldades. Com o acidente teve seu olfato e audição ampliados, podendo ouvir até 6 metros de distância, e sentir o cheiro de pessoas que conhece a 15 metros. Isto lhe trouxe uma vantagem, perceber quem se aproxima, e uma desvantagem, ouve muito bem, e muitas vezes o que não quer, por isso anda sempre com um som alto para mascarar as piadas e comentários ofensivos que ouve diariamente a respeito de sua deficiência. Afora isto, com o estímulo que encontrou nos esportes, ainda enfrenta dificuldades para realizar seus exercícios físicos, pois segundo esta pessoa, a academia que frequenta encontra-se abandonada, a piscina é precária, tendo apenas uma bomba, que pode parar de funcionar a qualquer momento, dificultando ainda mais sua prática de exercícios. Além das áreas alagadas com a chuva, que dificultam seu trajeto e de muitos outros deficientes e pessoas normais frequentadores da mesma academia. Relata também a dificuldade que é nascer vendo e de repente perder a visão em um acidente, exemplifica contando o quão difícil é para ele, dormir acreditando que pode pilotar moto e tudo que antes fazia, e quando acordar perceber o pesadelo que é não enxergar as coisas, esbarrar nos móveis, depender de motoristas de ônibus e funcionários de diferentes empresas e instituições para guiá-lo. Estuda Marketing, é apaixonado por psicologia, mas pretende estudar Direito. Enfim, é um grande exemplo de superação. Ao ser interrogado sobre o que poderia melhorar na universidade, praticamente aponta a necessidade de que as pessoas se importem mais, como por exemplo, os seguranças deveriam oferecer ajuda, e se possível carona; Deveria haver mais compreensão das pessoas para com os deficientes, que muitas vezes têm comportamento agressivo, ele explica que não é fácil ser lembrado o tempo todo de que ele é portador daquela deficiência, ele sabe disso e não precisa de lembretes durante todo o tempo. Os deficientes podem e brincam entre si, se chamam de cegos, aleijados, mas se uma pessoa normal os chama desta forma, os machucam. As mulheres são as mais afetadas principalmente pelo padrão que a mídia estabelece, por isso se tornam mais carentes e são muitas vezes apontadas como promíscuas.

Bibliografia

BATTIBUGLI, T. Política e Ética. Disponível em: . Acesso em: 17 mar. 2012.

Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Disponível em: . Acesso em: 25 maio. 2012.

FROTA, T. Arquitetura acessível. Disponível em: < http://thaisfrota.wordpress.com>. Acesso em: 25 maio. 2012.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Manual de acessibilidade espacial para escolas: O direito à escola acessível!. Disponível em: . Acesso em: 25 maio. 2012.

PEÑALOSA, E. UFPE – Mobilidade e Acessibilidade. Disponível em: < http://pedalandoeolhando.blogspot.com.br/2011/08/ufpe-mobilidade-e-acessibilidade.html>. Acesso em: 25 maio. 2012.

PORTAL MEC. Declaração de Salamanca Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das Necessidades Educativas Especiais. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf>. Acesso em: 25 maio. 2012.


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